domingo, 1 de agosto de 2010

"Amor Líquido". Zygmunt Bauman (Relógio d´Água, 2006)

“Se lhes perguntassem, os habitantes da Leónia, uma das Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino, diriam que a sua paixão é “desfrutar de coisas novas e diferentes”. De facto. A cada manhã, “vestem roupas novas em folha, tiram latas fechadas do mais recente modelo de frigorífico, ouvindo jingles recém-lançados na estação de rádio mais quente do momento”. Mas a cada manhã “as sobras de Leónia de ontem aguardam pelo camião do lixo” e cabe indagar se a verdadeira paixão dos leonianos não seria na verdade “o prazer de expelir, descartar, limpar-se de uma impureza recorrente”. Caso contrário, por que seriam os varredores de rua “recebidos como anjos”, mesmo que a sua missão fosse “cercada de um silêncio respeitoso” (o que é compreensível: “ninguém quer voltar a pensar em coisas que já foram rejeitadas”)?
Pensemos…
Será que os habitantes do nosso líquido mundo moderno não são exactamente como os de Leónia, preocupados com uma coisa e falando de outra? Garantem que o seu desejo, paixão, objectivo ou sonho é “relacionar-se”. Mas será que, na verdade, não estão principalmente preocupados em evitar que as suas relações acabem congeladas e coaguladas?”

“Como apontou Ralph Waldo Emerson, quando se esquia sobre gelo fino, a salvação está na velocidade. Quando se é traído pela qualidade, tende-se a procurar a desforra na quantidade. Se “os compromissos são irrelevantes” quando as relações deixam de ser honestas e parece improvável que se sustentem, as pessoas tendem a substituir as parcerias pelas redes. Feito isso, porém, assentar torna-se ainda mais difícil (e adiável) do que antes: agora já não se tem a habilidade que faz, ou poderia fazer, a coisa funcionar. Estar em movimento, antes um privilégio e uma conquista, torna-se uma necessidade.”

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