sexta-feira, 12 de novembro de 2010

"Eleonora". In Todos os Contos 2 (Edgar Allan Poe, Círculo de Leitores / Quetzal, 2010)

Neste conto encontrei a minha livre interpretação para o enigma daqui.

“Ela vira que o dedo da morte estava sobre o seu seio; que, tal como a flor efémera, a perfeição da beleza apenas lhe fora concedida para morrer, mas os terrores da sepultura, para ela, residiam tão-somente numa reflexão que me revelou uma tarde, ao crepúsculo, nas margens do Rio do Silêncio. Sofria ao pensar que eu, depois de tê-la sepultado no vale da Relva Multicor, deixaria para sempre os seus aprazíveis recônditos, transferindo o amor que tão apaixonadamente lhe dedicara para alguma donzela do mundo quotidiano exterior. E, nesse mesmo momento, rojei-me precipitadamente aos pés de Eleonora e fiz a jura, a ela e aos céus, de que nunca me ligaria pelos laços do matrimónio a qualquer filha da Terra, de que não seria de modo algum infiel à sua grata recordação, nem à lembrança do devotado afecto com que ela me abençoara.
[…]
Encontrei-me numa cidade estranha, onde todas as coisas poderiam contribuir para apagar a recordação dos doces sonhos que durante tanto tempo albergara no vale da Relva Multicor. A pompa e o aparato de uma corte majestosa, aliados ao desvairado clangor das armas e à radiosa beleza das mulheres, confundiram e inebriaram-me o cérebro. Mas até então a minha alma mostrara-se fiel à jura, os sinais da presença de Eleonora eram-me ainda concedidos nas horas silentes da noite.”