quarta-feira, 23 de junho de 2010

Glossário Bauman (em construção)

Cidade – Seja qual for o futuro das cidades, e por muito que o seu traçado mude, ou mudem o seu aspecto e o seu estilo, ao longo dos anos e dos séculos, haverá uma sua característica que continuará sempre presente: as cidades são lugares cheios de desconhecidos que convivem em estreita proximidade. Sendo uma componente permanente da vida urbana, a presença contínua e ubíqua de desconhecidos ao alcance dos olhos e das mãos introduz um grau considerável de incerteza nas actividades dos habitantes das cidades. Essa presença, impossível de evitar excepto por brevíssimos instantes, constitui uma fonte inextinguível de angústia e de agressividade latente, dando lugar a ocasionais explosões.
A cidade provoca mixofilia e, ao mesmo tempo, mixofobia. A vida urbana é um assunto que provoca, intrínseca e irremediavelmente, emoções opostas. Quanto maior e mais heterogénea é uma cidade, mais motivos de atracção pode conter e oferecer. A concentração maciça de desconhecidos é um repelente e, ao mesmo tempo, um íman poderosíssimo que atrai legiões de homens e mulheres cansados da monotonia da vida rural ou provinciana, fartos da uniformidade quotidiana e aborrecidos pela escassez de perspectivas correspondente. A variedade é uma promessa de oportunidades, de oportunidades diferentes e múltiplas, de oportunidades para todos os gostos e aptidões. Por conseguinte, quanto maior for a cidade, mais provável será que atraia um número cada vez maior de pessoas que se sentem mal ou não encontram bem-estar nem prosperidade em lugares mais pequenos e, por isso, menos tolerantes frente aos que se desviam da norma e mais mesquinhos na oferta de oportunidades.
A insegurança produz medo, pelo que não é de estranhar que os urbanistas atribuam a máxima urgência à necessidade de a combater. O problema é que, além da insegurança, é possível que desapareçam também das cidades as principais atracções da vida urbana, como a espontaneidade, a maleabilidade, a capacidade que a caracterizam de surpreender e de ser ocasião de aventura. O que se substitui à insegurança não é o êxtase da calma, mas a maldição do tédio. Será possível eliminar o medo suprimindo igualmente o tédio?

Vide Condomínio; Mixofobia; Medo; Exclusão; Insegurança; Espaço público.


Condomínio fechado – É bem sabido que todas as vedações têm dois lados. Dividem um espaço uniforme em exterior e interior. Mas os que se encontram de um dos lados da vedação vêem o exterior onde os que estão do outro lado vêem o interior. Os residentes dos condomínios isolam-se, por meio da sua vedação, do caos e da dureza que tornam a vida urbana desconcertante, desagradável e vagamente ameaçadora, e ficam reclusos num oásis de calma e de segurança. Ao mesmo tempo, contudo, separam os outros dos lugares decentes e seguros, cujos valores estão dispostos a defender encarniçadamente, e abandonam-nos às mesmas ruas sórdidas e miseráveis de que fugiram sem olhar a despesas. A vedação separa o guetto voluntário dos ricos e dos poderosos dos inumeráveis ghettos forçados em que os deserdados vivem. Para os que fazem parte do ghetto voluntário, os restantes ghettos são lugares onde nunca porão os pés. Para os habitantes dos ghettos involuntários, em contrapartida, o território a que estão confinados (ao verem-se excluídos de todos os outros lugares) é um espaço do qual se encontram proibidos de sair.
Os espaços vetados têm um único e só objectivo múltiplo e implacável: separar os enclaves extraterritoriais do território contínuo da cidade, erigir pequenas fortalezas em cujo interior os membros integrantes da elite supra-territorial e global possam vestir-se a seu gosto, cultivar-se e gozar a sua independência física e o seu isolamento em espírito dos lugares concretos. Na paisagem da cidade, os espaços vetados convertem-se nos pontos de referência da desintegração da vida em comum solidamente estabelecida num sítio.

Vide Cidade; Mixofobia; Exclusão; Medo; Desconfiança; Insegurança; Espaço público.

Decomposição do Estado socialVide Novas classes perigosas; Estado moderno.

Desconfiança – no tipo da actual insegurança predomina a desconfiança perante os outros e as suas intenções, ao mesmo tempo que uma atitude que nega ou considera impossível contar com a constância e a fiabilidade da companhia dos seres humanos. Castel atribui esta situação ao individualismo contemporâneo; sugere que a sociedade de hoje, ao suprimir as comunidades e corporações estreitamente unidas que outrora delimitavam as normas e velavam pelo seu cumprimento, e ao substituí-las pelo dever imposto a cada um de se ocupar de si próprio e dos seus próprios assuntos, passou a assentar no território movediço da incerteza: numa sociedade deste tipo, é inevitável que a segurança e o medo de perigos imprecisos acabem por se tornar males endémicos

Vide Insegurança.

Desemprego – Em lugar de ser a condição de desempregado (termo que sugere um desvio da norma, um contratempo passageiro que pode e deve ser solucionado), estar sem trabalho assemelha-se cada vez mais a estar a mais, a ser-se rejeitado por supérfluo, por inútil, pois ninguém quererá dar emprego a quem esteja nessas condições, que predestinam quem as sofre a permanecer economicamente inactivo. Estar sem trabalho implica que o indivíduo deixou de ser imprescindível, até mesmo que tenha deixado para sempre de ser necessário, vendo-se desterrado para o depósito de lixo do progresso económico, progresso que, em última análise, se reduz a realizar o mesmo trabalho, com ganhos idênticos, mas com menos pessoal e por meio de um custo de mão-de-obra inferior. O desempregado de hoje, sobretudo aquele que o é por um período prolongado, está a um passo de cair no buraco negro dos desclassificados: homens e mulheres que não pertencem a qualquer grupo social legítimo, indivíduos situados à margem de qualquer classe, aos quais não corresponde nenhuma das funções aprovadas, úteis e indispensáveis desempenhadas pelos cidadãos “normais”, pessoas que com nada contribuem para a sociedade, excepto com o que é prescindível e não interessa.

Vide Exclusão; Novas classes perigosas.

Espaço público – desde o princípio, as cidades foram sítios onde os desconhecidos conviviam em estreita proximidade, sem deixarem de ser desconhecidos. Viver em companhia de desconhecidos é sempre um tanto alarmante (embora nem sempre assustador), uma vez que estes, por natureza, e diferentemente do que se passa com amigos e inimigos, albergam intenções, pensamentos e modos de reagir perante situações comuns que nos são desconhecidos, ou não suficientemente conhecidos – o que nos impede de anteciparmos o seu comportamento. Uma grande multiplicidade de desconhecidos suscita o sentimento, endémico e incurável, de que pode acontecer qualquer coisa de imprevisível. Por outras palavras: os desconhecidos são a personificação do risco. Os lugares semeados de risco em geral atraem e repelem ao mesmo tempo, sendo extremamente incerto e variável, impossível de determinação exacta, o ponto do qual uma reacção se transforma na reacção oposta.
O espaço será público sempre que os homens e as mulheres a ele tenham acesso, sendo provável que o usem sem selecção preliminar. Quando não sejam exigidas autorizações, nem haja registo de quem entra e quem sai. Por conseguinte, a presença no espaço público deverá ser anónima, o que torna inevitável que as pessoas que nele se encontram não se conheçam entre si, nem sejam conhecidas pelos encarregados do espaço em questão. Os espaços públicos são lugares onde os desconhecidos convergem e, desse modo, condensam e resumem os traços característicos da vida urbana. É nos espaços públicos que a vida urbana, e tudo o que a diferencia de outros tipos de existência colectiva, alcança a sua expressão máxima, juntamente com as suas alegrias e tristezas proverbiais, as suas antecipações e as suas esperanças.
Tudo isto faz com que os espaços públicos sejam lugares onde a atracção e a repulsa competem entre si, em proporções diferentes e rapidamente variáveis. São, portanto, lugares vulneráveis, propensos a acessos maníaco-depressivos ou esquizofrénicos, mas são, ao mesmo tempo, também os únicos onde a atracção tem a possibilidade de suplantar a repulsa e até de a neutralizar. São, em poucas palavras, lugares onde se descobrem e põem em prática os métodos de uma vida urbana satisfatória. Os lugares públicos são o cenário concreto nos quais se decide, precisamente hoje, o futuro da vida urbana (e também da convivência mundial, dado que a maioria dos habitantes do planeta reside em cidades).
Para sermos mais exactos: não estamos a referir-nos aos espaços públicos em geral, mas somente aos que renunciam tanto à ambição moderna de apagar as diferenças do mapa, como à tendência pós-moderna que conduz à fossilização dessas mesmas diferenças através da separação e do afastamento recíprocos. Falamos dos lugares públicos que reconhecem o valor original e enriquecedor da diversidade e que animem pessoas que são diferentes a entabularem um diálogo que valha a pena. A tendência que impele ao abandono dos lugares públicos e à reclusão em ilhas habitadas apenas por um mesmo tipo de pessoas idênticas acaba por ser o principal obstáculo que nos impede o convívio com a diferença, uma vez que faz definhar, até à supressão, a capacidade de dialogarmos e de negociarmos. Pelo contrário, o contacto com a diferença acabar por se tornar com o tempo o factor principal de uma coexistência gratificante, uma vez que estiola e suprime as raízes urbanas do medo.

Vide Cidade; Condomínio, Medo; Insegurança; Mixofobia; Exclusão.

Estado moderno – o Estado moderno teve de assumir desde o início a tarefa esmagadora de lutar contra o medo. Teve de remendar a rede de actividades assistenciais que as revoluções contemporâneas romperam e de continuar a repará-la à medida que a modernização permanente que esse mesmo Estado promovia operava sobre ela uma erosão e uma tensão intermináveis. O desenvolvimento do Estado moderno conduziu inexoravelmente à instauração de um Estado social cujo núcleo era a protecção em sentido estrito (quer dizer, a prevenção colectiva destinada a evitar os danos particulares) e não a redistribuição da riqueza, ao contrário do que admitia uma crença generalizada. Acima de tudo, o grande número de pessoas que não contava com outro capital que não fosse o seu trabalho podia confiar na colectividade. A solidariedade transformou a capacidade de trabalho num capital de substituição, do qual se esperava, até certo ponto justificadamente, que contrabalançasse a soma dos restantes capitais.

Vide Medo.

Exclusão – Tal como os que não têm emprego, os delinquentes (quer dizer, os condenados à prisão, os acusados de um crime, os submetidos à vigilância pessoal ou simplesmente “fichados”) já não são vistos como indivíduos temporariamente da vida social, susceptíveis de serem reeducados, reabilitados e devolvidos à sociedade o mais depressa possível; são antes olhados como marginalizados perpétuos, incapazes de regeneração e obrigados a observarem pelos séculos dos séculos regras de boa conduta, longe da sociedade e das pessoas decentes.

Vide Novas classes perigosas; Desemprego; Cidade; Condomínio; Mixofobia; Espaço público.


Individualismo contemporâneo – A sobrevalorização do indivíduo, desembaraçado dos entraves que uma rede muito densa de vínculos sociais lhe impunha, e a consequente perda da protecção que com a maior naturalidade lhe oferecia a referida rede de vínculos sociais, tornaram o indivíduo frágil, como nunca antes fora. A primeira novidade abriu a grande número de pessoas todo um mundo, estimulante e sedutor, em que se tratava de pôr em prática a emancipação e a auto-superação. Mas a segunda novidade vetou o acesso a um número muito maior. As duas por junto acabaram por se transformar no sal da culpa que exasperava, uma e outra vez, a ferida incurável da impotência. E o resultado foi o aparecimento de uma nova doença: o medo de ficar para trás.

Vide Desconfiança; Insegurança; Medo; Sofrimento de origem social.

Insegurança – apesar de nunca termos vivido em sociedades tão seguras como hoje, nunca sentimos tanto mal-estar pela insegurança que o mundo actual nos ocasiona. Somos nós, criados com delicadeza e panos de veludo, que nos sentimos muito mais ameaçados, inseguros e assustados, numa sociedade que “se organizou em torno de uma procura infinita de protecção e da insaciável aspiração à segurança” (citando Robert Castel).
Frederick Barth, o grande antropólogo norueguês contemporâneo, mostrou claramente que, ao contrário do que sustenta a errónea opinião corrente, não se traçam fronteiras para separar diferenças, mas que, pelo contrário, é quando se traçam fronteiras que as diferenças bruscamente surgem e se toma consciência ou se passa a levar em conta a sua existência. Mais precisamente dito: é justamente para legitimar as fronteiras que se inicia a busca das diferenças. Sejam tais diferenças quais forem, é a natureza das fronteiras que traçámos que as determina. Cada fronteira cria as suas próprias diferenças, atribuindo-lhes consistência e sentido. A que obedece esta obsessão de traçar fronteiras? A resposta é que, actualmente, essa obsessão deriva do desejo, consciente ou inconsciente, de procurarmos um canto suficientemente confortável, acolhedor e seguro, num mundo que se mostra, aos nossos olhos, selvagem, imprevisível e ameaçador; do desejo de resistirmos à corrente, de nos protegermos das forças externas que parecem invencíveis e que não podemos controlar nem deter, que mais não seja impedindo a sua presença nas imediações das nossas casas, nas nossas ruas. Seja qual for a natureza dessas forças, conhecemo-las por um nome que, ao mesmo tempo, elucida e confunde: a globalização – ou, como Alberto Melucci preferia dizer, a “planetarização”.

Vide Desconfiança; Cidade; Medo; Espaço público.


Medo – os actuais medos nasceram com a irrupção simultânea da liberalização e do individualismo, numa altura em que se haviam tornado já frouxos ou quebrado os laços de parentesco e de vizinhança que uniam com firmeza as comunidades e corporações, laços que tinham sido considerados eternos ou que, pelo menos, existiam desde tempos imemoriais. Para combater o medo, a modernidade sólida adoptou um método que tendia a substituir os laços naturais, irreparavelmente deteriorados, por laços artificiais equivalentes, ou seja, toda a espécie de associações, sindicatos e agrupamentos, a tempo parcial embora de dedicação permanente, unificados por actividades quotidianas comuns; a solidariedade passou a ocupar o lugar da pertença, erigindo-se em principal defesa frente aos avatares de uma existência cada vez mais aventurosa. A dissolução da solidariedade assinalou o final da luta contra o medo adoptada pela modernidade sólida. Chegou a hora de afrouxar, desmantelar ou quebrar os mecanismos de protecção artificiais e dirigidos. A Europa está a viver hoje a segunda parte da liberalização acompanhada pelo individualismo. Quando a competição substitui a solidariedade, as pessoas vêem-se abandonadas aos seus próprios recursos, dolorosamente escassos e manifestamente insuficientes.

Vide Individualismo contemporâneo; Mixofobia; Condomínio; Cidade; Insegurança; Espaço público.

Mixofobia – a mixofobia é uma reacção previsível e generalizada perante a inconcebível, arrepiante e aflitiva variedade de tipos humanos e de costumes que coexistem nas ruas das cidades contemporâneas e nos seus bairros de tipo mais corrente (quer dizer, os que são desprovidos de espaços vetados).A mixofobia manifesta-se pela tendência que impele a procurar ilhas de semelhança e de igualdade no meio do mar da diversidade e da diferença. Essa tendência de procurar uma comunidade de semelhantes não significa apenas que se renuncia à alteridade do exterior, mas também que se quer assim evitar a influência recíproca, animada embora turbulenta, estimulante ainda que incómoda, que se dá no interior de cada um. A atracção exercida pela comunidade de semelhantes é a de uma apólice de seguros contra os múltiplos perigos acarretados pela vida de todos os dias num mundo multilingue. Não reduz esses perigos, nem os esconjura tão-pouco em absoluto. Como todos os paliativos, não faz mais do que prometer um refúgio contra os seus efeitos mais imediatos e temidos. Quanto mais tempo permanecemos num meio uniforme – na companhia de pessoas semelhantes, com as quais podemos comunicar em termos superficiais e prosaicos sem nos expormos a mal-entendidos nem termos a necessidade humilhante de nos esforçar por traduzir significações radicalmente diferentes -, maior se torna a probabilidade de “desaprendermos” a arte de chegar a fórmulas de conciliação e a um modus convivendi.
A paranóia mixofóbica é um círculo vicioso que age como uma profecia portadora do gérmen da sua própria realização. Oferece-se e aceita-se a segregação como se esta fosse um remédio radical para o perigo que os estranhos representam, e o resultado é que a convivência com os estranhos se torna, de dia para dia, mais difícil. Homogeneizar os bairros, e reduzir depois ao mínimo inevitável todo o comércio e comunicação entre eles, é uma receita infalível para aliviar e intensificar o desejo de segregar e de excluir. Uma medida semelhante pode contribuir para aliviar as dores das pessoas atacadas pela mixofobia, mas trata-se de um remédio por si próprio patogéneo e que agrava o sofrimento, o que faz com que sejam requeridas doses cada vez mais fortes de medicamento para que a dor seja suportável. A homogeneidade social do espaço, acentuada e reforçada pela segregação, reduz a capacidade de tolerar a diferença entre os habitantes das cidades e multiplica as ocasiões que podem dar origem a reacções mixofóbicas, o que aumenta os perigos da vida urbana, tornando-a mais carregada de ansiedade, em vez de mais agradável e fácil de viver. A fusão exigida pelo entendimento mútuo só pode resultar da experiência compartilhada, e compartilhar a experiência é inconcebível se, primeiro, se não compartilhar o espaço.

Vide Condomínio; Cidade; Exclusão; Medo; Espaço público.


Novas classes perigosas – as classes perigosas originárias eram formadas por uma população excedentária, temporariamente excluída e ainda por integrar, que se vira despojada de qualquer função útil pelo ritmo do progresso económico e acabara por ficar privada de toda a protecção através do processo que desintegrava aceleradamente todas as anteriores redes de laços sociais. As novas classes perigosas, por outro lado, são as que se consideram como não aptas para a integração, por isso sendo declaradas inassimiláveis, já que não parece concebível qualquer função que pudessem vir a desempenhar depois de reabilitadas. Não são apenas excedentárias, mas também supérfluas. Deste modo, vêem-se excluídas permanentemente, portanto: e trata-se de um dos poucos casos de permanência que a modernidade líquida não só permite, mas também vivamente fomenta. Este actual tipo de exclusão não é visto como resultado de uma má sorte passageira, mas antes como um destino irrevogável. Mais ainda, a exclusão tende, hoje em dia, a ser um beco sem saída. Quando se queimam os navios, é muito difícil voltar a construí-los. A inexorabilidade da ordem de despejo e as perspectivas pouco animadoras de qualquer tentativa de recorrer da sentença são o que converte os actuais excluídos em classes perigosas.
A irreversibilidade da exclusão é uma consequência directa, ainda que imprevista, da decomposição do Estado social, quer dizer, de um conjunto de instituições consolidadas, mas também da decomposição – se quisermos falar em termos mais eloquentes – de um ideal ou de uma experiência. A fraqueza, a deterioração e o desmoronamento desse mesmo Estado pressagiam, bem vistas as coisas, o desaparecimento das oportunidades de resgate e a supressão do direito a apelar da sentença, do mesmo modo que a dissipação gradual da esperança e o progressivo abandono da vontade de resistir.

Vide Exclusão; Desemprego; Cidade; Condomínio; Mixofobia.

Persistir - não temos, pois, outro remédio que não seja contentarmo-nos com o que existe. Trata-se de uma constatação que não tem por que nos desanimar ou quebrar a vontade de viver, mas deve antes servir-nos de estímulo e infundir-nos energia. Embora não possamos extirpar por completo a dor, podemos, nalguns casos, eliminá-la em parte e, noutros, aliviá-la. A questão está em sabermos persistir nisso, uma e outra vez, sem desfalecermos.
A sociedade humana distingue-se de um rebanho de animais porque é possível nela haver quem seja sustentado por outrem; distingue-se porque tem a capacidade de conviver com inválidos, e de tal maneira que poderíamos dizer que a sociedade humana nasceu com a compaixão e a prestação de cuidados a outrem, qualidade que são exclusivamente humanas. O problema que hoje nos preocupa diz respeito a saber como poderemos transpor essa compaixão e essa solicitude à escala planetária.


SegregaçãoVide Mixofobia; Cidade; Condomínio; Exclusão; Novas classes perigosas; Medo; Espaço público.

Sofrimento - o nosso sofrimento – bem como o medo de sofrer, ou a dor irritante e insuportável que resulta desse mesmo medo – tem por origem a supremacia da Natureza, a caducidade do nosso próprio corpo e a insuficiência dos nossos métodos de regulação das relações humanas no interior da família, do Estado e da sociedade.

Vide Medo.
Sofrimento de origem social – Se a protecção disponível e os benefícios a que acedemos não atingem o grau ideal, se a vida de relação não nos satisfaz, se as instituições não são como deveriam ser (ou como cremos que poderiam ser), é provável que comecemos a suspeitar da existência de intrigas e conspirações hostis, de todo o tipo de conjuras urdidas por inimigos ocultos. Em última instância, acabaremos por ver por toda a parte más intenções, culpados, crimes e desígnios criminosos.

Vide Desconfiança; Insegurança; Individualismo contemporâneo; Medo.


SolidariedadeVide Medo.

2 comentários:

  1. olá! achei muito bom o seu blog...
    gostaria de saber a referência bibliográfica exata utilizada no primeiro trecho: "cidade"
    vc conseguiria pra mim, por gentileza? =]
    muito obrigada!

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  2. Bauman, Zygmunt. Confiança e medo na cidade (tradução de Miguel Serras Pereira, edição Relógio d´Água, Lisboa, 2006). Páginas 33, 43, 44 e 65.

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